No sábado, 7 de dezembro, João Lucas Reis da Silva, tenista profissional de 24 anos, fez a coisa mais normal que alguém faz hoje em dia. Ele postou uma selfie de casal no Instagram.
Era aniversário do companheiro dele, então ele postou um carrossel fofo deles posando à beira d’água no Rio de Janeiro. “Eu te amo muito”, escreveu ele. A postagem fez dele um pioneiro – o primeiro tenista profissional gay ativo – mas ele apenas desejou um feliz aniversário ao seu parceiro.
“Não pensei nisso… só queria postar uma foto com ele”, disse Reis da Silva O atleta Domingo de São Paulo, em sua primeira entrevista internacional desde que acidentalmente entrou para a história do tênis.
Cerca de uma hora antes, ele havia vencido um torneio pela primeira vez em quatro anos, derrotando Daniel Dutra da Silva por 7 a 5, 1 a 6, 6 a 4, garantindo a Taça Procópio e garantindo uma vaga garantida nas eliminatórias para o Rio Open. , evento ATP 500 em que ele competiu nos últimos dois anos. Não são dias ruins para o número 367 do mundo.
“Foi uma semana louca, mas no final foi perfeita”, disse ele. Depois de duas longas dispensas por lesão, o jogador de 24 anos disse que vinha jogando o melhor tênis de sua vida recentemente, chegando às semifinais de um torneio no Chile antes de disputar o título em São Paulo. Mesmo que ele sentisse que o mundo do tênis o estava observando de uma forma nunca vista antes.
“Não senti nenhuma pressão”, disse ele. “Eu estava feliz. Eu estava com meu amigo aqui comigo. Ele me apoiou. Toda a minha equipe esteve aqui.”
O torneio de tênis feminino contou com vários jogadores que não eram gays, incluindo os maiores de todos os tempos Billie Jean King e Martina Navratilova, que ganharam 98 títulos de Grand Slam de simples e duplas.
As coisas eram diferentes no tênis masculino. Bill Tilden, a estrela americana que dominou o tênis na década de 1920, nunca falou publicamente sobre sua sexualidade, exceto em seu livro de 1948, My Story: A Champion’s Memoirs. Brian Vahaly, que jogou na década de 2000 e atingiu o auge de sua carreira como número 57 do mundo, e Bobby Blair, que fez turnê na década de 1980, se aposentaram após se aposentar do tênis profissional.
Reis da Silva disse no domingo que contou à família e amigos que era gay há cinco anos. “Antes era difícil”, explicou ele.
“Eu não podia contar muito sobre mim aos meus treinadores e amigos. Quando tentei me amar, foi diferente. Mudou a minha vida, mudou tudo, a relação com os meus pais, com os meus treinadores.”
Há mais de um ano, Reis da Silva se apaixonou por Gui Sampaio Ricardo, ator e modelo brasileiro. Aí o aniversário de Ricardo se aproximou de 2024 e Reis da Silva fez o que fazem os jovens de 24 anos.
“Pensei: ‘Meu Deus, é aniversário do meu namorado’. Como feliz aniversário. Eu te amo.’ E então, bum!
“Era tão normal para mim que nem pensei nisso.”
Notícias e apoio chegaram de grandes nomes dentro e fora do mundo do tênis. Lulu Santos, uma grande estrela da música no Brasil, mandou uma mensagem para ele. Thiago Monteiro, atual número 1 do Brasil, adicionou emojis de coração à postagem. Ele recebeu uma curtida de Diego Hypolito, ginasta gay brasileiro que conquistou a medalha de prata nas Olimpíadas do Rio de 2016.
Dessa forma, esse jogador praticamente desconhecido do Recife, cidade litorânea do nordeste do Brasil, tornou-se um ícone esportivo e cultural. Ele disse que esperava algumas reações negativas, mas as reações foram “99,9% positivas”.
“Estou muito feliz que as pessoas me respeitem, que olhem para mim, talvez me admirem”, disse ele.
Em entrevista ao The Telegraph em 2018, Vahaly disse ter ouvido comentários homofóbicos de outros jogadores no vestiário e descreveu isso como “parte da cultura”. Ele acrescentou que espera um momento em que “possamos dizer ‘parabéns’ e depois seguir em frente rapidamente. Precisamos superar as pessoas que se definem por sua sexualidade”.
Reis da Silva, que disse saber que Vahaly foi homenageado pelo US Open (ele será presidente da USTA a partir de 2025), lembra-se de ter 18 anos e ouvir alguém dizer algo ofensivo na academia.
“Nos vestiários e nos torneios, sempre ouvia coisas que me incomodavam”, disse ele.
“Mas quando comecei a dizer a todos que era gay e essas pessoas sabiam disso, pararam de dizer essas coisas. É como se eles respeitassem mais alguém próximo a eles que é gay. Pare de fazer comentários de merda”, disse Reis da Silva.
“Talvez seja algo importante para impedir isso – se as pessoas virem alguém no topo que é gay, as coisas podem mudar. As pessoas poderiam parar de dizer coisas que não deveriam magoá-las.”
Alison Van Uytvanck, a ex-número 37 do mundo recentemente aposentada e casada com a fisioterapeuta Emilie Vermeiren, disse que nunca recebeu comentários negativos no vestiário. Numa entrevista no início deste ano, Van Uytvanck disse O atleta que era “de alguma forma surpreendente” que ainda não houvesse um jogador masculino ativo no ATP Tour.
“Se apenas um jogador, digamos um dos 100 melhores jogadores, falasse abertamente sobre isso, seria mais fácil para outros se abrirem.”
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Reis da Silva disse que fez uma grande diferença para ele ver um modelo no esporte.
“Quando eu tinha 16, 15 anos, tive problemas para me aceitar.
“Talvez fosse mais fácil para mim me aceitar e me amar se alguém tivesse jogado e dito: ‘Sou gay, estou aqui, estou participando dos grandes torneios’. Isso é o que as pessoas me disseram. As pessoas me disseram que me admiravam. Que eu inspiro as pessoas. Então é um grande negócio para mim e para ela.
“Não tenho problema em ser lembrado como o grande tenista gay”, disse ele, “mas não quero falar sobre isso todas as vezes, sabe?
“Eu sei que vou receber muita atenção.”
Nascido em uma família de tenistas, Reis da Silva disse que começou a bater na bola aos três anos. Ele seguiu os passos do irmão, que era seis anos mais velho que ele e competia no nível júnior. Quando menino, Reis da Silva era tão obcecado pelo tênis que chorou quando o pai lhe disse que era hora de voltar para casa.
Aos 10 anos começou a competir nacionalmente e aos 13 saiu de casa para São Paulo, onde morou e treinou por sete anos antes de se mudar para o Rio de Janeiro. Reis da Silva prefere lutar desde a linha de base em vez de avançar para a rede, e considera o retorno do saque e o backhand como suas maiores armas.
“Adoro quebrar saques”, disse ele. “Gosto de manter a posse da bola, ser agressivo no forehand e fazer grandes jogadas.”
Além da América do Sul, ele também competiu nos EUA, Europa e Austrália e participou de Grand Slams como júnior. Após a vitória em São Paulo, ele planeja tirar uma semana de folga, incluindo alguns dias de férias com o amigo em Porto de Galinhas, cidade litorânea conhecida por suas piscinas naturais e areia branca. Ele então passará o Natal com a família do amigo em Goiânia, uma pequena cidade no centro do país, perto da capital Brasília.
Ele então retornará ao Rio para iniciar os preparativos para alguns torneios Challenger (um nível abaixo do ATP Tour), que antecederão o South American ATP Tour Swing e o Rio Open em fevereiro. Seu grande objetivo para 2025 é participar das eliminatórias para Roland Garros – e construir a vida de tênis que deseja.
“É um esporte individual, então você pode ser o que quiser”, disse ele, esperançoso. “Todo mundo vai aceitar você.”
(Foto superior: João Pires/Photojump)